segunda-feira, 25 de julho de 2011

COM A PALAVRA: OS JOVENS, ADULTOS E IDOSOS

A educação de adultos torna-se mais que um direito: é a chave para o século XXI; é tanto conseqüência do exercício da cidadania como condição para uma plena participação na sociedade. Além do mais, é um poderoso argumento em favor do desenvolvimento ecológico sustentável, da democracia, da justiça, da igualdade entre os sexos, do desenvolvimento socioeconômico e científico, além de um requisito fundamental para a construção de um mundo onde a violência cede lugar ao diálogo e à cultura de paz baseada na justiça.
(Declaração de Hamburgo)

Oi, gente boa, olha eu aqui de novo! Como sempre, andei muito ocupada por esses dias, mas não demorei muito a voltar, não é? Das outras vezes passavam-se meses até surgir uma oportunidade para escrever (algo que eu adoro!)
Então, MÃOS À OBRA!!!!! A postagem de hoje, ainda é pautada em experiências do meu trabalho na UNEB. Hoje falarei um pouco sobre os alfabetizandos, tanto do Programa AJA Bahia quanto do Programa TOPA, ambos fizeram adesão ao Programa Federal “Brasil Alfabetizado”. Na verdade, não falarei sobre os alfabetizandos. Farei melhor! Darei a eles à palavra. Afinal de contas, quem melhor do que eles para expressarem suas emoções e sentimentos, não é verdade? Entretanto, iniciarei o texto com algumas informações que julgo importantes para o conhecimento de tod@s.
Os programas de Alfabetização de Jovens, Adultos e Idosos “AJA Bahia” e “TOPA – Todos pela Alfabetização” possuem objetivos muito parecidos:
@  O Programa Aja Bahia / Brasil Alfabetizado teve por objetivo garantir, à população não alfabetizada, tanto do meio rural quanto do meio urbano, o direito à alfabetização, por meio de cursos com duração de seis meses; proporcionando, não apenas a aprendizagem do ler, escrever e contar, como também as ferramentas de análise e reflexão sobre a realidade, respeitando-se as diversidades locais e culturais. (Programa encerrado em 2007)
@  O Programa TOPA – Todos pela Alfabetização / Brasil Alfabetizado tem por objetivo promover uma educação Integral e de qualidade para a população de jovens, adultos e idosos assegurando seu ingresso e permanência na escola, garantindo-lhe as oportunidades necessárias à apropriação da leitura e da escrita e criando as condições objetivas para a sua intervenção na realidade social na qual estão inseridos.
Então, percebemos que o objetivo maior de ambos os programas é proporcionar aos jovens, adultos e idosos não alfabetizados as condições que lhes garantam à apropriação das habilidades de ler e escrever, de forma efetiva. Para isso, os programas supracitados funcionam como um primeiro passo numa caminhada que busca o “saber ler e escrever”. Esse primeiro passo é a AFABETIZAÇÃO.
Os Programas de alfabetização para jovens, adultos e idosos tem como objetivo elevar o nível de alfabetismo desses sujeitos que não tiveram essa possibilidade quando mais jovem. Para que a leitura e escrita realmente lhes sirva de instrumento para melhorarem suas vidas e a sociedade em que vivem, esses alunos precisam reconhecer-se como cidadãos produtivos e criativos, capazes de aprender, donos de uma importante bagagem cultural, que pode ser enriquecida continuamente.  Dessa forma, o primeiro tema trabalhado com os alfabetizandos é a IDENTIDADE, porque é essencial promover o fortalecimento da auto-estima dos jovens, adultos e idosos que estão iniciando seu processo de alfabetização.
Outra questão muito importante é que o professor/alfabetizador deve desenvolver um trabalho de alfabetização adequado às necessidades de aprendizagem dos alunos, acreditando que todos são capazes de aprender e precisam ter sucesso em suas aprendizagens para se desenvolverem pessoalmente e para terem uma imagem positiva de si mesmos, orientando-se por esse pressuposto. Então, vamos ver se tal objetivo tem sido alcançado nessa longa jornada dos programas aqui mencionados?
Agora, com a palavra alguns jovens, adultos e idosos que participaram desse processo de alfabetização.
 DEPOIMENTOS DE JOVENS, ADULTOS E IDOSOS ALFABETIZANDOS
Durante o período que atuei como Supervisora, no Programa AJA Bahia, realizei diversas visitas para acompanhar como estavam sendo desenvolvidas as ações do Programa nos municípios do interior da Bahia. Em muitas dessas visitas, me emocionei com os relatos e depoimentos de alfabetizandos jovens, adultos e idosos. Depoimentos de pessoas humildes, mas possuidoras de um vasto conhecimento e uma grande sabedoria adquiridos ao longo de muitos anos.

Lembro-me de uma senhora, na zona rural do município de Campo Alegre de Lourdes, que em minha primeira visita contou-me sobre seu grande sonho de aprender a ler e escrever. Disse-me que ao realizar esse sonho sua primeira ação seria tirar uma nova Carteira de Identidade, pois o fato de ter em seu RG a palavra ANALFABETA, em letras enormes, a deixava triste e envergonhada. Essa senhora, cujo nome não me recordo agora, nunca faltara um único dia de aula e, todos os dias ela atravessa o rio (que passava próximo a sua casa) numa canoa e depois caminhava cerca de 2 horas até chegar à escola. Puxa! Poucas vezes havia visto tamanha determinação numa pessoa.
“Tenho vontade de aprender a ler, pegar um livro e ler, ler, ler até cansar. Ler assim, pam pam pam até dizer chega! (risos da alfabetizanda) Nunca perdi um dia de aula” (Aluna da 3ª Etapa do Programa AJA Bahia. Município de Campo Alegre de Lourdes - BA. Depoimento coletado pela Supervisora do Programa, Meyre Anne Sampaio Moreira, em 2006).

Sabe o que é mais interessante em pessoas determinadas? É que, na grande maioria das vezes, elas conquistam o seu objetivo. Pois é, não poderia ser diferente com aquela senhora de Campo Alegre de Lourdes. Meses depois, retornei ao município e à sala de aula onde ela estudava. Sabe o que encontrei? Uma senhora radiante, esbanjando alegria. Ela fez questão de mostrar para mim sua nova Carteira de Identidade. É óbvio que não havia mais aquela palavra incômoda que a deixava triste e envergonhada. Ao contrário, agora ela se sentia renovada e orgulhosa! E não era para menos, ela conseguira realizar um sonho de criança: “aprender ler e escrever”. E tem mais! Ela disse a mim, que nas próximas eleições faria questão de votar, para mostrar que não precisava mais sujar o dedão de tinta, pois agora sabia assinar. Linda a sua história! Uma mulher guerreira que soube correr atrás daquilo que desejava e sabia que era capaz de conquistar. Ela ouvira dizer que a idade não era empecilho para que se pudesse aprender. E, é verdade! A aprendizagem não acontece ao longo da vida?
No mesmo ano, numa visita ao município de Brejolândia, ouvi um depoimento interessante de uma alfabetizanda.
“E aí ela (se refere a orientadora pedagógica do Programa AJA Bahia, no município) chegou, chegou, ficou na frente e falou assim: _ E aí M. N., o que é mais importante para você, hoje? Eu disse: _ Estudar. Quanto mais a gente aprender, melhor (...). Aí, eu tava pensado, porque a gente hoje mora assim, afastado. Aí, uma hora a gente quer viajar e a gente chega, aí chegar assim, ô fulano que nome é esse aqui? Não pode! Quanto mais a gente vier a saber e aprender, mais será melhor...” (Aluna da 3ª Etapa do Programa AJA Bahia. Município de Brejolândia – BA. Depoimento coletado pela Supervisora do Programa, Meyre Anne Sampaio Moreira, em 2006).

Os depoimentos dos alfabetizandos nos remete a reflexão da representatividade da leitura e da escrita em suas vidas.
L. de Souza, alfabetizanda da Etapa I do Programa 
TOPA – Todos pela Alfabetização / Brasil Alfabetizado. Ano 2008
Alfabetizando da Etapa II do Programa 
TOPA – Todos pela Alfabetização / Brasil Alfabetizado. Ano 2009
Agora, segue depoimentos de alfabetizandos da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização / Brasil Alfabetizado:
“Meu nome é J. T., tenho 68 anos, moro na comunidade Buji e aqui estou aprendendo a ler aos 68 anos. Para mim o maior prazer foi quando entrei na escola como aluno e, mais ainda, quando comecei a aprender meu nome e a fazer conta. Graças a Deus hoje posso estudar, pois antes tinha que ir para a roça, acordava cedo  e tinha que dormir cedo, pois não agüentava ir para escola que o enfado não permitia. Agora posso pegar meu caderno e dizer vou pra à escola do topa e quando saio da sala, saio feliz. Aprendi uma nova coisa, uma nova palavra e agora tenho o mundo em minhas mãos. Espero aprender cada vez mais e agradeço aos que trouxeram o topa para essa escola. Agradeço a D. de Souza, a Josefa, que é minha professora e a Lucilene, minha amada coordenadora. Obrigada! Meu nome é J. T., sou aluno do topa com muito orgulho” (Aluno da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Santa Brígida / Povoado Maranco – BA. Depoimento coletado pela Coordenadora de Turmas, L. A. de Souza, em 2010).

“Eu dou muito valor a escola do TOPA, porque eu tive mais oportunidade de lembrar as minhas sabedorias. Coisa tola que hoje ninguém mais quer saber, mas eu gosto e ensino a meus fiii e eles dão risada, diz que é tolice de véi” (Sr. M. Souza, aluno da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Candiba – BA. Depoimento coletado pela Coordenadora de Área, M. Z. do Nascimento, em 2010).

“Eu pego no caderno e no livro, e vejo às letras e vou lendo e juntando as letras e formando as palavras” (Dona M. D. Paixão, aluna da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Itiúba – BA. Depoimento coletado pelo Coordenador de Área, O. Rocha, em 2010).

Em uma de suas visitas de acompanhamento das ações do Programa TOPA, o Coordenador de Área, O. Rocha, em conversa com alguns alfabetizandos ouviu os depoimentos de L. da Silva, M. Auxiliadora e C. dos Santos que declararam, respectivamente, que:
“Se agente conhecer as letras, agente entende”. “Eu aprendo a escrever lendo”. “Eu aprendi a ler juntando as letras e as palavras” (Alunos da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Jaguarari – BA. Depoimento coletado pelo Coordenador de Área, O. Rocha, em 2010).

Já no município de Pindobaçu, o alfabetizando R. Pereira ao terminar a tarefa, olhou pra professora e disse:
“5 X 4 = 20 e 4 X 4 = 16, ai formou 36 porque 20+16 = 36. Fiz ligeiro né professora? Isso eu gosto, gosto de multiplicar. Nisso eu sou ligeiro (...)” (Sr. R. Pereira, aluno da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Pindobaçu – BA. Depoimento coletado pelo Coordenador de Área, O. Rocha, em 2010).

Em Ponto Novo, na ocasião da visita, a Coordenadora de Área, C. Matos, ouviu o Sr. A. Mendes, dizer que:
“É devagar que se chega lá. Tudo que se tem boa vontade se alcança. Mesmo velho, vai da boa vontade. Se tiver boa vontade alcança. Batalhar até o dia da morte” (Sr. A. Mendes, aluno da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Wenceslau Guimarães – BA. Depoimento coletado pela Coordenadora de Área, C. Matos, em 2010).

Em Amargosa, minha linda Terra Natal (desculpem-me! Mas eu não poderia deixar de citar esse importante aspecto da cidade onde cresci. Da cidade Jardim), a Coordenadora de Área, E. J. Brito, ouviu o seguinte depoimento:
“(...) Eu gosto da minha professora, ela é boa pra mim, pra os meus colega. Agente já chega cansado da roça e não tem vontade de estudar, mas mermo assim eu vou. A senhora acha que eu venho mode que? Eu venho por causa da minha professora. Ela é boa com a agente e os colega vem prosiando e ai o tempo passa rápido, a gente nem se dá conta. Eu já acostumei, eu gosto muito” (A. P., aluna da Etapa III do Programa TOPA – Todos pela Alfabetização. Município de Amargosa – BA. Depoimento coletado pela Coordenadora de Área, E. J. Brito, em 2010).

Conclusão
Ao avaliar as ações de Programas voltados para a educação de jovens, adultos e idosos não se deve deixar de observar que os efetivos resultados são fruto de um direito adquirido por um segmento social que, historicamente, teve seu direito à educação, negado desde o início da história da educação no país. A Educação de jovens e adultos obteve muitas conquistas durante sua trajetória na educação brasileira e, atualmente se constitui um campo de direito e de responsabilidade pública, entretanto, ainda há muito por ser feito. De qualquer modo, ao se pensar numa reconfiguração nessa modalidade de ensino, deve-se levar em conta de que todos aprendem ao longo da vida. Que a alfabetização não tem idade, se realiza dentro e fora da escola, causa impactos entre gerações e representa um pilar fundamental na aprendizagem, essencial para o desenvolvimento humano e para melhorar a qualidade de vida do sujeito quanto ser social.
(...) saber ler e escrever melhora a qualidade de vida das pessoas de muitas e profundas maneiras, não necessariamente de natureza econômica. A alfabetização mantém vínculos estreitos com a dignidade humana, a auto-estima, a liberdade, identidade, a autonomia, o pensamento crítico, o conhecimento, a criatividade, a participação, o empoderamento, a consciência e a transformação social, todos eles importantes satisfações humanas, para as condições materiais de vida. (TORRES, 2006, p. 9)



REFERÊNCIAS 
TORRES, R. M. Alfabetización y aprendizaje a lo largo de toda la vida. Instituto Fronesis. 2006.
Disponível em: <www.oei.es/alfabetizacion/AprendizajePermanenteESP.pdf>.

VÓVIO, Cláudia Lemos (coordenação) / [ilustrações de Cecília Esteves]. Viver, aprender: educação de jovens e adultos. (Livro 1). São Paulo: Ação Educativa; Brasília: MEC, 1998.