quarta-feira, 15 de setembro de 2010

GANHEI UM PRESENTE: ATUAR COMO FORMADORA

"Sem a curiosidade que me move,
que me inquieta, que me insere na busca,
não aprendo nem ensino".
Paulo Freire

Em 2007, teve início a 4ª Etapa do Programa AJA Bahia/Brasil Alfabetizado, porém, com a mudança de governo do estado fomos orientados a chamá-lo apenas de 4ª Etapa/Brasil Alfabetizado.
A Universidade do Estado da Bahia (UNEB), por intermédio da Pró-Reitoria de Extensão (PROEX) e do Núcleo de Educação de Jovens e Adultos (NEJA) teve como metas alfabetizar 11.446 jovens e adultos em 31 municípios localizados em diferentes regiões da Bahia e realizar a Formação Inicial e Continuada de 591 Alfabetizadores e 40 Orientadores Pedagógicos.
Neste ano, uma das Coordenadoras do Colegiado do NEJA, a professora Maria José de Faria Lins, convidou-me a integrar a equipe do NEJA de modo fixo. Então, deixei a Supervisão do Programa (foi uma decisão difícil, pois adorava viajar pelos municípios, conhecendo pessoas novas com idéias diferentes e ter contato com os alfabetizandos, pessoas admiráveis) e assumi novas atribuições dentro do Programa.
Fazíamos de tudo no NEJA, desde preparar os kits com materiais didáticos e enviá-los aos municípios até a organização da formação inicial dos alfabetizadores e orientadores pedagógicos que atuavam no Programa.
Nossa! Em tempos de formação, nossa vida virava de pernas para o ar. Era uma loucura, um corre-corre para dar conta de todas as demandas exigidas para que tudo ocorresse da melhor forma possível.
Começávamos pelo planejamento pedagógico da formação, que contava com a participação de professores da UNEB que atuavam como formadores do Programa. Após o término do planejamento, começava a loucura. Corríamos contra o tempo para providenciar a reprodução do material pedagógico a ser usado na formação, confecção de folders e crachás, arrumação das pastas com o material impresso e dos kits com o material de consumo a ser utilizado durante os cinco dias de formação.
Entravamos em contato com todas as entidades de todos os municípios envolvidos no Programa para marcarmos a formação e em seguida, fazíamos contato com restaurantes, lanchonetes, hotéis e pousadas para orçar o valor dos serviços que seriam prestados durante o período formativo. Após avaliar os valores e a qualidade dos serviços oferecidos retornávamos o contato para fechar com o fornecedor que vencera na cotação de preços.
Fazíamos contato com os formadores que iriam atuar nos municípios e dávamos suporte aos mesmos fazendo toda a logística da formação. Os formadores recebiam tudo prontinho, desde o recurso para custear as suas despesas a detalhadas informações, como: nome das empresas de ônibus que faziam linha para cada município onde haveria a formação, horários de saída e de retorno, valores de passagens, etc.
Éramos nós também, os responsáveis por fazer as folhas de pagamento, tanto dos prestadores de serviço das formações quanto dos formadores. UFA! Como a gente trabalhava! Todo esse trabalho de organização e execução das ações a serem desenvolvidas durante e depois da formação, era realizado por um grupo de apenas seis pessoas.
Tina cuidava da reprodução do material, Faby era responsável em montar os kits de formação e enviá-los aos municípios, as Coordenadoras do Colegiado assumiam o planejamento da formação e a seleção dos formadores, Clóvis cuidava das folhas de pagamento e eu... Ahhhhhh! Eu fazia toda a parte de contato. Ligava para os municípios marcando a data da formação, solicitava orçamentos para os serviços de alimentação, hospedagem e transporte dos alfabetizadores, orientadores pedagógicos e formadores em cada município envolvido. Era ainda responsável pela análise, contratação e negociação dos serviços supracitados, além de participar de todas as outras tarefas realizadas pelos meus colegas de trabalho.
Recordo-me, que nos períodos de formação eu ia dormir as 02:00h e acordava as 06:00h para dar conta de tantas demandas. Nívia, minha eterna amiga e companheira (com quem dividia apartamento aqui em Salvador) ficava muito preocupada comigo, pois eu me doava de “corpo e alma” para que as coisas saíssem a contento.
No final, tudo saía como planejado e o reconhecimento de um bom trabalho realizado, conquistado com muito empenho, dedicação e responsabilidade era muito gratificante para mim. E, esse reconhecimento não ficou apenas nos elogios e nas palavras, veio também em forma de atitudes e ações.
Em agosto, a professora Lins me deu a honra de realizar a última formação do Programa, fechando o ciclo de formações realizadas nos 31 municípios que ficara sob a responsabilidade da UNEB/NEJA. Nossa! Era tudo que eu mais queria naquele momento, adquirir experiência como formadora do Programa Brasil Alfabetizado.
A Formação aconteceu no município de Marcionílio Souza, com a participação dos alfabetizadores e orientadores pedagógicos do próprio município de Marcionílio e do município de Boa Vista do Tupim. Estavam escritos 28 participantes e a freqüência da formação foi de 100%.
Para muitos alfabetizadores, presentes no Encontro de Formação, o Programa representava um grande desafio. Chegaram cheios de expectativas e trazendo muitas angústias na bagagem.
No primeiro dia, o nervosismo era visível na grande maioria dos alfabetizadores, principalmente de Marcionílio Souza. Alguns se mostraram muito tímidos. Comecei então, a instigá-los fazendo inquirições diretas àqueles que notei ter maior dificuldade em participar das discussões e atividades onde tivessem que expor suas idéias e os resultados começaram a surgir pouco a pouco, mas progressivo.
No segundo dia, a equipe de Boa Vista do Tupim estava mais a vontade, participando, questionando, tirando dúvidas e até pedindo sugestões de como resolver algumas situações-problemas envolvendo alguns de seus alfabetizandos. Ao Trabalhar com os indicativos de Analfabetismo em nosso Estado, pedi que um representante de cada município fosse até a projeção da tela e localizasse o seu município, verificando na legenda em que nível o mesmo se encontrava. A experiência foi chocante, pois ambos os municípios se encontravam com índices entre 32 e 36% da sua população com idade superior a 15 anos em condição de analfabetismo. Essa estratégia surtiu um efeito positivo, visto que a maioria começou a questionar os motivos para tal situação e procurar buscar sugestões para minimizar esse quadro de vergonha para todos nós. Passei então, a mostrá-los que parte dessa mudança dependia de cada um de nós e, principalmente, daqueles que firmaram um compromisso para alfabetizar esses jovens e adultos. Assim, os alfabetizadores começaram a se conscientizar de que mais que um objetivo esta é uma questão de responsabilidade social, pois a língua de cada indivíduo, além de expressar sua identidade, também é um meio de exercer a cidadania e, portanto, o direito a ler e escrever não podia continuar a ser negado a esses cidadãos.
Na primeira noite de atividades percebi um enorme avanço do grupo, mas confesso que fiquei um pouco surpresa com os ótimos resultados obtidos no terceiro dia. Inclusive, o orientador pedagógico de Marcionílio que confessou estar sentido dificuldades com esse novo grupo de alfabetizadores, justamente pela timidez e falta de preparo para atuar numa sala de EJA, também se mostrou surpreso com o desempenho da sua equipe. Ele não se conteve e teceu elogios e palavras de incentivo para que seu grupo pudesse praticar nos Espaços Educativos, tudo o que aprendeu e demonstrou durante as oficinas. Realmente, foi gratificante presenciar e ouvir dos próprios envolvidos no processo como haviam crescido e evoluído em tão pouco tempo. É obvio que isso só foi possível porque apesar das dificuldades enfrentadas por eles, os mesmos demonstraram ser pessoas esforçadas, dedicadas e receptivas às “novidades”.
Durante os encontros de formação os alfabetizadores receberam orientações, sugestões e materiais de apoio com o intento de aprofundar seus conhecimentos visando dinamizar suas aulas, tornando-as mais interessantes e “atraentes”, buscando motivar o alfabetizando a participar ativamente das mesmas.
Os dois orientadores pedagógicos demonstraram estar desenvolvendo um bom trabalho. Ao participar do planejamento pude constatar a dedicação, o compromisso e a responsabilidade de ambos. Durante todo o planejamento eles orientaram e deram sugestões de atividades para serem aplicadas nos espaços educativos, promoveram a interação entre os alfabetizadores favorecendo a troca de experiências entre os mesmos, o que enriqueceu as aulas planejadas.
Analisando o desempenho dos alfabetizadores na participação das atividades propostas e na execução das tarefas solicitadas, posso atribuir o bom desempenho dos mesmos aos momentos de intervenções feitas durante todas as atividades e discussões, onde não me eximia em fazer observações e dar feedback das atividades desenvolvidas por eles. Enfatizava o bom desempenho do grupo, como também os orientava quanto ao que poderia ser melhorado.
Para minha primeira atuação como Professora Formadora, posso dizer que a experiência foi um SUCESSO! Embora, devo chamar a atenção para um fator muito importante: mesmo que tenham sido pensadas, planejadas e desenvolvidas situações de estudo, leitura, discussão e reflexão que favoreceram a aprendizagem do alfabetizador e o avanço da sua prática pedagógica, devemos considerar que não é suficiente que o mesmo saiba o que deve ser feito, mas que também deseje por em prática o que aprendeu, o que absorveu de novo.

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